quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O que é a língua para a linguística? Qual diferença de língua e linguagem?

Olá, caríssimos,

Assim como a vida é o objeto de estudo da biologia, a língua é, a
princípio, o objeto de estudo da linguística. Dependendo de como cada
subramo da linguística encara o fenômeno linguístico, temos diferentes
aspectos da língua sendo ressaltados e outros não. Assim, a morfologia
estuda a estrutura dos vocábulos e os processos de formação desses
vocábulos. A fonologia não está interessada na estrutura das palavras,
mas na natureza dos fonemas que constituem o significante dessas
palavras. A semântica já não privilegia nem a estrutura, nem os sons
da língua, mas o significado que as palavras e frases apresentam
dentro ou fora do contexto. A sintaxe só preocupa com as regrasque
conbinam as palavras em frases e textos, sem se preocupar com a forma
interna das palavras, ou sua constituição sonora, ou mesmo o
significado das palavras tomado isoladamente. A pragmática estuda os
fatores da situação em que a mensagem é enunciada e como eles
contribuem para a formação dos enunciados e textos. A linguística
textual estuda os modos de construção dos textos em geral; a
linguística aplicada articula a linguística e outras ciências social
no que elas contribuem para o ensino de línguas, por exemplo. A
linguística geral, que é o que vocês devem estudar sempre, estuda
todas as línguas como realizações diferentes de um mesmo fenômeno.
Trata-se de uma teoria aplicável a qualquer língua. Os princípios
gerais descobertos pela linguística geral devem ser conhecidos de
todos os pesquisadores que atuam na morfologia, sintaxe, semântica e
muitas outras áreas da linguística. Claro que tudo isso é bem genérico
e didático. Há lingüistas mais ortodoxos, por exemplo, que não
reconhecem a linguística textual ou aplicada como ramos da
linguística, por partirem de pontos de vista epistemológicos
diferentes. Vocês é que devem, aos poucos, escolher o campo de estudos
em que desejam se aprofundar. Por ora, é preciso ter mente aberta para
as várias possibilidades de estudo e pesquisa.

Com relação à segunda pergunta, a língua como
"sistema de signos vocais". Essa é apenas uma de milhões de definições
de língua. Em primeiro lugar, é preciso saber o que é um "sistema".
Imagine que eu quero vender um palio para um de vocês. Um aluno se
interessa pelo carro, concorda com valor pedido, faz o pagamento e
espera o recebimento do carro. Pois bem. Esse aluno, por confiar
demais no professor, simplesmente não vistoriou o carro antes de
comprá-lo. O que ele recebeu foi uma caixa enorme contendo todas as
peças do carro. E ainda reclamou: "mas, professor, o carro tá todo
desmontado na caixa! Não foi isso que eu comprei!". Então o professor
tem o direito de redarguir: "claro que foi isso que você comprou!. Nós
combinados de eu te vender um palio e foi o que eu fiz!". Realmente o
professor foi meio malicioso, mas o aluno, apesar da surpresa, não
tinha muito do que reclamar. De fato, um carro foi vendido. O problema
é que esse carro não constituía um "sistema". Logo, sistema, em
sentido amplo, é um conjunto de unidades que cooperam para a
realização de uma tarefa específica. As peças de um carro não são um
sistema, porque precisam estar montadas, precisam interagir umas com
as outras para que exista um carro, e não um emaranhado de peças. A
tarefa específica desse carro é transportar pessoas, né? Pois é. Se as
peças não estiverem todas articuladas umas com as outras, esse sistema
carro não pode realizar a tarefa específica para a qual foi
idealizado.

Assim também acontece com a língua. Pensemos as peças do carro como
sendo os signos da língua. Os signos se relacionam uns com os outros
para a produção de frases e textos. Assim, enquanto as peças do carro
se articulam umas com as outras para fim de servir como meio de
transporte, os signos da língua se articulam entre si para servirem de
meio de comunicação.

É importante frisar que se pode estudar a língua sem o propósito da
comunicação. Quando se estuda morfologia, por exemplo, vemos as formas
dos verbos, dos pronomes, dos advérbios, sem necessariamente estarmos
diante de frases completas que serviriam a um propósito de comunicação
efetiva entre emissor e receptor. Daí a necessidade de distinguirmos
língua de linguagem. A linguagem aparece como uma "capacidade". Seria uma habilidade, um dom, uma propriedade da espécie humana de pôr em prática toda uma gama de regras de sintaxe, de conbinação de fonemas em morfemas, de morfemas em palavras, de palavras em enunciados, de enunciados em textos em geral. Assim como o motorista, que, pelo menos, teria a habilidade de dirigir, ou seja, de pôr em ação o sistema que é um carro, o falante de qualquer língua teria a capacidade de pôr em prática outro sistema que é a língua. É claro que motorista e falante têm propósitos diferentes. O primeiro
usa de um sistema para o fim de locomoção, o segundo usa de outro
sistema para o fim de comunicação. Quando nos referimos às unidades da
língua, sem nos preocuparmos com a comunicação, estamos estudando a
língua, conhecendo a língua. Quando nos preocupamos com a língua em
ação, em determinada situação comunicativa, estamos estudando a
linguagem. Temos então o estudo da linguagem da propaganda, da
linguagem literária, da linguagem jornalística, da linguagem dos fora
da lei, da linguagem dos italianos radicados no interior de São Paulo
etc etc etc..... Todas essas linguagem são o uso específico de algo
mais geral: a língua portuguesa. A linguagem, seria a capacidade de usar a língua. Assim como o motorista tem a capacidade de usar um carro, o falante tem a capacidade de usar a língua. Há várias outras definições da linguagem.

Há quem considere a linguagem como sendo o produto da nossa capacidade
de usar a língua, e não a capacidade em si mesma. A linguagem
jornalística seria, por exemplo, o conjunto de características típicas
dos textos redigidos nesse tipo de linguagem. A linguagem literária
seria o conjunto de características típicas dos romances, contos e
novelas e assim por diante.

(MAD)

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